Então, Annebonny

Eu acho que existe uma situação diferente nesse caso. De fato, a violência doméstica e os casos de \"crimes passionais\" são bem mais comuns tendo o homem como autor do que como vítima (apesar de sabermos que há, sim, um número bem expressivo de mulheres praticando os mesmo crimes - talvez com métodos diferentes -, mas ainda assim os mesmos). E sim, trata-se de uma questão cultural. Mas vejo que esses homens que se tornam violentos com as companheiras são aqueles que ainda enxergam a mulher como sua propriedade. Para além da rejeição, está a \"posse\", os \"plenos direitos\" sobre a outra pessoa que, geralmente, depende do agressor, seja material ou emocionalmente. E a mulher nesse caso, mesmo que inconscientemente, partilha dessa mentalidade, também se vê como dependente, como propriedade do outro.

Já no caso do assunto desse tópico, o inconformismo com um fora tomado depois de uma investida inicial, vejo a situação inversa. É também parte da nossa cultura que o homem se arrisque, que ele seja \"o caçador\", enquanto à mulher cabe o papel de rejeitadora, a \"presa difícil\", a quem cabe decidir se quer ou não ser capturada. Dentro desse cenário, é até mesmo esperado que o homem ouça vários \"nãos\" e, portanto, também é esperado que ele saiba lidar com isso.

Também é parte da nossa cultura que esse caçador esteja sempre disposto e receptivo ao que deveriam ser as \"raras\" investidas femininas no papel de caçadoras. Ou seja, supostamente, os homens deveriam estar \"sempre a fim\", a não ser em casos extremos como, por exemplo, ele ser cantado pelo dragão de São Jorge.

O problema é que hoje, as investidas femininas já não são raras, mas muitas mulheres continuam acreditando que os homens são obrigados a bater continência para qualquer criatura que use saias e não seja padre. Quando elas tomam um \"não\" pelo meio das fuças, a primeira coisa que pensam é \"se ele não é viado, eu sou o próprio dragão de São Jorge\". Entre acabar de vez com a própria auto-estima e jogar a culpa na sexualidade do cara, elas optam pela segunda alternativa.

Já quando um homem toma um fora (e como eu disse acima, teoricamente deveria estar acostumado com isso) e não se conforma, das duas, uma: ou ele é a arrogância e prepotência alive and kicking, ou ele vem de algum lugar onde as coisas são diferentes. Certa vez conheci um rapaz sul-africano que me confessou ter levado um bom tempo para entender a lógica da \"paquera\" no Brasil, porque na terra dele jamais uma mulher rejeitaria um homem. Não faz parte da cultura deles que a mulher tenha essa \"liberdade\".

Cultura, cultura, cultura, amiga Annebonny. Cultura.