Reprodução: imagem enviada pela autora

Venho de uma família de 4 irmãos,dois são do casamento de minha mãe que ficou viúva muito jovem. Depois de alguns anos ela conheceu meu pai e ficou grávida de mim. Meu pai sabendo da situação fugiu e nunca mais apareceu e ela assumiu e me criou sozinha.

Quando eu tinha 5 anos minha mãe teve meu irmão, que hoje está com 20 anos e aí que tudo começou. Ela ficou muito doente e teve complicações após o parto. Sem ninguém para ajudá-la a cuidar do bebê, pois o pai dele também não quis assumir e eu me vi com minha mãe doente e um bebê recém nascido em casa que não parava de chorar.

Começamos a passar fome pois minha mãe não podia mais trabalhar e o dinheiro da pensão só dava para pagar o aluguel e comprar remédios. A sorte era que tínhamos bons vizinhos que, de vez em quando, apareciam com um pratinho de comida. Ficamos um tempo com meu irmão e logo minha mãe viu que não havia como ficarmos mais com ele e pediu à minha avó que cuidasse dele até ela melhorar. Foi muito triste para nós, principalmente porque a minha avó morava em outra cidade e seria difícil de vê-lo. Ficamos eu e ela sozinhas pois meus outros 2 irmãos, um com 15 e o outro 18 anos, só apareciam para incomodar, bêbados, drogados, etc... E isso só agravava mais a doença da mamãe.

Eu vendo tudo aquilo sofria muito. Depois de algum tempo meu avô veio nos ajudar com a mudança para ir embora com eles para Otacílio Costa, a situação não melhorava e não tinha mais como ficarmos daquele jeito. Fomos embora com o sonho de que tudo seria diferente, mas nada foi como o esperado.

No começo ficamos felizes pois ganhamos uma casinha na fazenda onde meu avô trabalhava, mas cada dia dia mamãe piorava mais e junto com isso veio a depressão e, às vezes passava dias trancada no quarto sozinha e não falava com ninguém e eu ficava sozinha pela casa sem falar com ninguém pois minha família quase não aparecia, eu passava o dia todo lendo ou cuidando da casa e sonhando que isso tudo um dia fosse mudar.

As idas aos hospitais passaram a ser constantes, eu estava sempre ao lado dela, quando estava internada eu era a acompanhante, dava banho, comida e auxiliava no que ela precisava todos no hospital me admiravam por cuidar tão bem dela, quando não tinha poltronas para o acompanhante eu só jogava um lençol no chão e ali eu descansava a noite.

Não tive infância,não sei o que é isso, tive que aprender o lado duro e triste da vida muito cedo, ia para a aula pela manhã, caminhava mais ou menos 2 km todos os dias para chegar até a escola pois era no sítio e não tinha ônibus, quando voltava da escola eu mesma preparava o almoço para eu e minha mãe pois ela não andava mais, nem mesmo mudava de lado na cama pois teve um AVC que comprometeu sua coordenação motora. Eu levantava várias vezes a noite para ajudá-la a tomar água, fazer as necessidades ou sentar um pouco pois cansava.

Nunca soube o que é comemorar um Natal ou Páscoa em família com minha mãe, meus avós se afastaram e mesmo morando perto nunca auxiliaram nas necessidades que tínhamos, pois achavam que a minha mãe era dengosa e não compreendiam a situação. Imagina que com 13 anos eu ia ao banco receber a pensão dela, fazias as compras do mês, comprava seus medicamentos e tudo mais.

Mas tudo o que fiz - e me orgulho disso - não foi suficiente para ajudar a minha mãe a viver, a última vez que a minha mãe me viu ela estava entrando em uma UTI pois havia amputado a perna devido a uma trombose que deu pela falta de circulação, como ela tinha diabetes o corte não cicatrizou levando a uma infecção generalizada. A tristeza foi maior quando, depois de alguns dias na UTI, foi liberada a visita e eu fui vê-la. Quando cheguei ela me disse para abrir as cortinas porque estava escuro demais e não conseguia me ver, foi aí que me dei conta que a minha mãe estava cega, a diabetes subiu demais, tirou a visão dela. Chorei desesperada, tamanha a dor que eu sentia, lembrando disso eu ainda sofro muito, foi a última vez que falei com ela pois ela entrou em coma e no dia 12/09/99 ela acabou falecendo por falência múltipla de orgãos.

Foi o dia mais triste da minha vida até hoje, fiquei com minha tia por um tempo até o dia que ouvi minha vó e minha tia falando que iam me colocar em um orfanato pois não tinham como ficar comigo. Eu queria morrer pois só fazia 2 meses que minha mãe tinha falecido e eles cogitavam essa idéia.

Porque? Eu me perguntava se valia a pena viver e várias vezes pensei em tirar minha vida, depois de alguns dias meu irmão mais velho apareceu, me falou que estava casado, tinha um enteado de uns 10 anos, serviço e não haveria problemas. Vim embora com ele e logo começou o inferno da minha vida, pois ele e a esposa obrigavam eu e o enteado dele a ir para o semáforo vender balas, pedir comida nos restaurantes, dinheiro. Eu andava maltrapilha e o dinheiro que a gente conseguia eles compravam bebida. Era mentira, ele não tinha serviço, viviam do que ganhavam dos outros na rua e do que o menino ganhava.

Não aguentei isso e fui morar com um casal para cuidar da casa e 2 crianças. Trabalhava pela moradia e comida, fiquei com eles bastante tempo e fui um pouco feliz. Se eu continuar contando essa historia vai ficar muito extensa, mas para teminar eu posso dizer que hoje estou casada, tenho 26 anos e 2 filhas, uma de 8 anos e outra de 19 meses, agradeço a Deus todos os dias pela minha vida,meu marido é um bom homem, trabalhador e um excelente pai.

Acredito que podemos vencer na vida indiferente do passado que tivemos. Agradeço pelo desabafo e por lerem minha história.

D.