A liberação sexual

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_Ana_
No PF desde: 19/09/2010

Texto de Contardo Callagaris:


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Uma menina de 12 anos grava um vídeo em que ela se penetra com um boneco e o manda para um correspondente on-line. A mãe da menina descobre o vídeo e seu destino; ela agradece a Deus, porque a menina não mostrou seu rosto. Logo, ela fica triste, pensando que a vida sexual da filha deveria ter começado de outra forma, numa relação terna, com alguém de verdade.


A história me fez pensar numa adolescente psicótica que encontrei durante meu primeiro dia de trabalho numa instituição do norte da França, na qual fui psicanalista nos anos 70. Ela se masturbava com uma lixa, sentada na poça de seu sangue, no meio de um ateliê de marcenaria; enquanto isso, os "terapeutas" fabricavam móveis para suas residências.


Durante dois anos, me encontrei com essa menina, a cada terça-feira de manhã —ela me ensinou que, na origem do desejo sexual, talvez esteja um imperativo raivoso e que nada tem a ver com amor e relações, algo como: goza, e doa a quem doer!


Naquela época, eu escutava meninos pré-adolescentes: muitos relatos de suas primeiras ejaculações eram cenas imaginárias de torturas e abusos sofridos. Quase sempre, essas cenas tentavam dar um sentido erótico ao exercício do poder absoluto e rigoroso dos pais.


Alguns desses jovens, no inverno, começaram sua vida sexual imaginando que eram forçados a praticar coitos dolorosos com as barras escaldantes do radiador do banheiro. Você acha exótico? Tudo bem, no Brasil não há radiadores, mas há piscinas; não são raros (e, às vezes, tem consequências apavorantes) os "incidentes" em que um menino fica com o membro preso pela sucção de um tubo de circulação da água. Você acha que são frutos do acaso?


Mais tarde, em Paris, animei um grupo (inspirado nos grupos Balint) de residentes plantonistas. Alguns se angustiavam ao encontrar incidentes sexuais inesperados —objetos introduzidos por algum orifício, mas que explodiam e feriam (lâmpadas, por exemplo) ou que eram perdidos dentro do corpo. Um desses jovens médicos disse que ele teria preferido receber um dia, como plantonista, um casal vítima do mítico "[*****] captivus", ou seja, de uma mistura de inchaço vascular com contração muscular, pela qual um casal não conseguiria se separar depois do sexo. Eu comentei que todos sonhamos com casais que se amam tanto que nem conseguem desgrudar, mas o sexo é outra coisa.


Por que conto essas histórias, que talvez causem um certo desconforto?


Em matéria de liberdade e liberação sexuais, a questão não é ser a favor ou ser contra; a verdadeira oposição pertinente é entre estes dois lados:


1) Há os que acham que nossa sexualidade se desenvolveria harmoniosamente, se ela não fosse reprimida. Para esse grupo, é a repressão que obriga nosso desejo a procurar caminhos tortos. Jamais uma menina "brincaria" com um boneco, se ela fosse autorizada a transar com seus amiguinhos à vontade;


2) Há os que acham, ao contrário, que nossa sexualidade se aproxima do que chamamos de "normal" só pela força da repressão. Para eles, o desejo é (não está, mas "é") torto, e só sendo reprimido ele se encaminha, eventualmente, para algum semblante de harmonia. Ou seja, sem repressão, fantasias com bonecos, lixas e tubos de piscina talvez nos interessassem mais do que brincadeiras com parceiros e parceiras.


Não se apresse em tomar partido. Até porque, entre os dois extremos, há muitas posições intermediárias. Mais duas recomendações e uma nota.


1) Se você defende e deseja a "liberação sexual", ótimo, estou com você. Mas cuidado com o que você deseja: nem sempre a gente aguenta.


2) Por favor, não demonizemos meninas que brincam com um boneco; sua sexualidade não é tão diferente da nossa.


Nota. A contracultura, desde os anos 50/60, é considerada responsável pela "liberação sexual". De fato, nas suas margens, abundavam os farsantes: os mais frustrados achavam que, enfim, iam poder "pegar uma mina", os menos sinistros tinham sonhos (quase bobos) de sexo festivo, liberado, cheio de amor e flores no cabelo.


Mas a liberação sexual da contracultura não foi nada disso: era claro, para os melhores, que o sexo, se fosse "liberado", seria brutal, exigente e cruento, como o desejo daquela menina louca sentada na poça de seu sangue. A maioria dos melhores tentaram viver à altura desse desejo "liberado"; muitos morreram na epidemia de Aids dos anos 80.


http://www1.folha.uol.com.br/colunas/contardocalligaris/2014/05/1448073-a-liberacao-sexual.shtml


Abbey
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No PF desde: 23/04/2012

Como todos os animais, sexo é instintivo e precisamos de barreiras para nortear o que é ou não permitido. Se não fosse assim, teríamos muito mais casos de pedofilia, zoofilia e todas as parafilias que nos chocam exatamente por serem moralmente ou eticamente inaceitáveis perante a sociedade.


Não acho que faz sentido liberar tudo. Permitir que uma criança de 12 anos transe com o amiguinho para evitar que ela "brinque" com um boneco não é tão simples assim. Tem que ver o caso... Quem era o interlocutor desta criança? Um adulto de mente doente que a leva a sensações prazerosas e a induz a usar o boneco para intensificar estas sensações enquanto ele (o adulto) chega ao doentio clímax? Ou uma outra criança descobrindo o corpo de uma maneira pouco convencional? Isso faz absolutamente TODA a diferença no modo como abordar a menina do boneco.


E sobre a total repressão também não funciona. É ela que dá origem não apenas aos drásticos casos de objetos por todos os orifícios e partes do corpo em todos os objetos, na busca pelo (instintivo) prazer. A falta de informação a respeito dos limites do corpo também gera uma geração doente.


O caminho é o do equilíbrio e do diálogo. Sexo não pode ser totalmente liberado. Temos que ter os limites, até para podermos curti-lo de forma mais saudável, senão nos tornamos meros animais irracionais. Mas também a repressão total é o tiro que sai pela culatra.


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_Ana_
No PF desde: 19/09/2010

então Abbey


estava comentando com amigos sobre as moças que pediram ao Papa para acabar com o celibato e o texto do Ivan Martins http://epoca.globo.com/colunas-e-blogs/ivan-martins/noticia/2014/05/renuncia-ao-bsexob.html ... em contraponto o Mauro postou este do Contardo...

minha primeira reação é reprimir, e pensar que se fosse um menino não fariam nenhum alarde... mas paro e reflito que minha avó casou com 14 anos, minha Tia também... e desejo sexual em crianças e adolescentes existe desde que o mundo é mundo... não somente pela maior exposição na mídia atual...

mesmo assim passados alguns anos nossa cultura percebeu o quanto é danoso para pessoas começarem sua vida sexual muito cedo... pela falta de compreensão mesmo, porque o ato sexual em si é fácil... entender as consequencias já é outra coisa... meninas precisam de maior orientação pelo simples fato de que engravidam!

além do risco enorme de encontrar algum pervertido que deturpe completamente do que é sexo prazeroso e do que é coerção...

concordo contigo que equilíbrio é fundamental...


Abbey
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No PF desde: 23/04/2012

Justamente... O negócio é tentar canalizar esta energia sexual natural de toda criança/adolescente para outros aspectos da vida: estudo, artes etc. Quando uma menina de 12, 13 anos ou até antes desperta para o lado sexual é impossível voltar atrás. O melhor é orientar e deixar a vida seguir seu curso, mesmo que isso doa para os pais.


Eu concordo que a precocidade sempre existiu, mas hoje a mídia, as músicas, tudo resulta numa sexualização antes do tempo e o pior, sem responsabilidade, e é difícil alienar uma criança do que está acontecendo no mundo.


Abbey
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No PF desde: 23/04/2012

Muito interessante o texto, _Ana_!


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_Ana_
No PF desde: 19/09/2010

:)


Anonima1
No PF desde: 14/02/2014

Posso estar fugindo um pouco do assunto, mas me lembrei desse documentário aqui. http://www.youtube.com/watch?v=8DAWyWtjZcI


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Si Cal
No PF desde: 06/08/2010

Eu pessoalmente acho que qualquer tipo de "LIBERAÇÃO" acontece em nossa mente...


Muitos acham que fazer sexo transloucadamente é liberação... NÃO isso para minha pessoa é libertinagem... (fazer sexo com varias pessoas a qualquer momento, sob qualquer aspecto é ruim muitas vezes...... deixa marcas... as vezes indeléveis... e abaixa a auto-estima... isso não é libertário é acorrentador).


Outros acham que "manter" a linha não é ser libertino .... NÃO isso para minha pessoa é acorrentamento (fazer sexo bem feito e com prazer mesmo que com um único parceiro é bom e libertario e não é promiscuo).


Abbey
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No PF desde: 23/04/2012

Si Cal, muitas vezes a libertinagem, ao invés de liberdade, traz acorrentamento! Esse acorrentamento das marcas que vc citou. O acorrentamento de uma imagem, que tem que ser mantida, ainda que a pessoa resolva mudar - a sociedade não deixa esquecer.


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Júpiter
No PF desde: 08/07/2010

"Ela se masturbava com uma lixa, sentada na poça de seu sangue, no meio de um ateliê de marcenaria"

"Naquela época, eu escutava meninos pré-adolescentes: muitos relatos de suas primeiras ejaculações eram cenas imaginárias de torturas e abusos sofridos."

"Alguns desses jovens, no inverno, começaram sua vida sexual imaginando que eram forçados a praticar coitos dolorosos com as barras escaldantes do radiador do banheiro."

"Mais tarde, em Paris, animei um grupo (inspirado nos grupos Balint) de residentes plantonistas. Alguns se angustiavam ao encontrar incidentes sexuais inesperados —objetos introduzidos por algum orifício, mas que explodiam e feriam (lâmpadas, por exemplo) ou que eram perdidos dentro do corpo."


Má esse tiozinho vive onde? Sodoma...Gomorra ?????????? kkkkkkkkkkkkkkkk