Mente moderna, coração careta. Nossas emoções nem sempre combinam com as nossas ideias.

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_Ana_
No PF desde: 19/09/2010

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Nem sempre nossas convicções andam juntas com as nossas emoções. É comum que a gente pense uma coisa e sinta outra. Ou defenda em teoria coisas que não conseguimos praticar. O ideal seria que dentro de nós valores e emoções andassem coladinhos, mas nem sempre acontece. Vira e mexe a gente se pega em contradição com a gente mesmo: achando uma coisa e fazendo outra; desejando diferente do que acha bonito.

Outro dia, conversando com uma amiga, ela comentou que aquilo que diz sobre sexo e fidelidade não tem muito a ver com a vida que ela realmente leva. O discurso dela é muito liberal, mas a realidade dela é bem careta. Uma coisa são as convicções dela sobre o que é certo nesse terreno, outra são as atitudes que ela tem vontade de tomar. As duas coisas não batem, e ela se sente uma fraude.

Acho que esse tipo de coisa acontece todo dia, com muita gente. Coerência é uma mercadoria que nem sempre está disponível quando o assunto envolve sentimentos.

No passado, quando a sociedade inteira era mais ou menos moralista, as pessoas faziam sexo por impulso, enganavam seus parceiros e traiam suas mais profundas convicções. Corriam riscos graves e sofriam ao fazê-lo. Agora, quando a maioria tornou-se liberal, muitas pessoas violam suas próprias crenças e levam vidas sexuais e afetivas que seus avós aprovariam. Não é engraçado?

O que há de comum e ingovernável nos dois casos é o desejo. Às vezes queremos transgredir, outras vezes temos necessidade de nos adequar. A beleza do tempo em que vivemos é que ele permite as duas coisas. Todas as coisas, na verdade. A menina que quer namorar meninas e experimentar os prazeres da transgressão, pode. Assim como a garota ou garoto que sonha com o grande amor e o casamento na igreja: também pode.

Além de bonita, essa liberdade é benigna. Pense nos milhões que viviam em sofrimento no passado, quando não se podia fazer nada que o padre não abençoasse. Imagine os milhões que sofreriam agora se todos fossem forçados a agir como “modernos”. Não dá. O espírito humano é avesso a esse tipo de uniformidade. As pessoas são diferentes entre si. Desejam e necessitam coisas diferentes. O papel da sociedade é respeitar - e impedir, vigorosamente, que os desejos sejam satisfeitos por meio de violência física ou qualquer outra espécie de coerção. O resto é interferência indevida.

Mas isso não resolve o desconforto da minha amiga.

Ela tem toda a liberdade do mundo, mas não tem vocação para exercê-la. Acontece com muita gente. O ambiente ao nosso redor ajuda a desenvolver ideias e a moldar nossos valores. Depois espera que atuemos de acordo. Mas, quando se trata de questões íntimas, nem sempre é possível. A pessoa pode ser intelectualmente a favor do sexo livre, da bissexualidade e do poliamor, mas, na hora de transar com alguém que não seja seu parceiro ou parceira, vacila, treme e broxa. Acontece o tempo inteiro. A cabeça está num lugar, o sentimento está em outro. O intelecto é livre, mas a consciência está presa a certas formas de viver. O que se faz?

Quem sente essa contradição como sofrimento pode buscar ajuda. Analistas são ótimos em identificar a causa das fissuras entre pensamento e sentimento. Um bom profissional pode ajudar a colocar as coisas em sintonia. Mas muitas pessoas não sentem a contradição como um problema. Estão em paz com a colisão de sentimentos e ideias. Sentem-se felizes com aquilo que são e sentem. Não me parece que haja nada de errado nisso.

Quando eu era criança, nos anos 60, teve início uma onda quase revolucionária que tinha a intenção de libertar todo mundo para os prazeres do sexo. As proibições eram muitas e aos poucos foram sendo derrubadas. Cinquenta anos depois, nós ainda vivemos sob os efeitos dessa borrasca salutar de permissividade.

O que a atual geração acrescentou de original a ela foi a percepção de que nem todos querem ser libertados. Muitos aplaudem a revolução sexual e até lutam por ela, mas preferem, pessoalmente, viver de maneira recatada. Mantêm relações monogâmicas desde cedo, casam-se por volta dos 20 anos e têm filhos. Ou ficam solteiros, mas sempre com um namoro de cada vez, comportadamente. Parecem viver tão felizes – ou mais – do que aqueles que estão na vida louca. Apenas de maneira diferente.

Deitados no divã do analista, talvez os comportados confessem fantasias que fariam corar o Marquês de Sade. Mas, e daí?

Todos têm fantasias inconfessáveis. Elas não desqualificam ninguém.

Hoje em dia podemos sonhar com tudo, até com a possibilidade de sermos caretas. Sem culpa.


é claro, texto do Ivan :)



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Nary
No PF desde: 20/08/2008

Gostei do texto...


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Ro Samy
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No PF desde: 24/11/2012

Em algumas coisas sou careta, em algumas liberal. Me sinto confortável transitando entre os dois, me permito a liberdade de ser o que sou.


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DannyOliveira
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No PF desde: 23/03/2013

Sou como a Ro também:liberal em certos pontos e careta em outros...A vida é assim:a gente sempre transita nesses pontos de liberdade...


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kvet
No PF desde: 05/06/2010

Eu durmo perfeitamente bem a noite sabendo que sou liberal e/ou careta com os outros e muitíssimo exigente comigo.

Nunca tive vergonha de admitir que dou liberdade aos outros que jamais daria para mim, pq sou EU a imagem refletida no espelho todos as manhãs e gosto de gostar o que vejo. E que em alguns assuntos sou tão rígida na minha opinião com o próximo como sou comigo mesma - gosto de saber que as pessoas que me cercam merecem o meu respeito e admiração. Mesmo que esse respeito e admiração sejam conceitos meus.


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_Ana_
No PF desde: 19/09/2010

sou como o texto...

muito liberal com a vida dos outros, acredito que não prejudicando ninguém tá tudo liberado... cabe a cada um escolher o que mais lhe é aprazível :)

já para minha vida sou bem menos liberal mas não me percebo muito careta em assuntos sexuais....


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Si Cal
No PF desde: 06/08/2010

Eu não são CARETA nem com outros nem comigo, mas não abro mao de algumas posições nem para eu nem para outros.


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precisofalar
No PF desde: 28/04/2008

Eu me vi na resposta da kvet... Sou liberal, mas careta também... Eu presto contas á minha imagem no espelho...


Li certa vez que a tendência dos adolescentes agora e de serem caretas, retornando um comportamento dos avós, porque o comportamento liberal não deixa nada a escolher, a desejar, a questionar, visto que tudo pode...