Carta aos Filhos

maya
Postado em:
20/06/2012 - 18:04
Ilustração: shutterstock.com

Resolvi me antecipar e deixar uma espécie de carta para que meus filhos possam ler quando eu estiver mais velhinha e já não conseguir mais me expressar ou escrever com clareza.

Os parágrafos não são de minha autoria, mas sinto como se fosse eu que tivesse proposto o conteúdo à escritora.

Pesquei o que gritou para meu coração no livro da Martha Medeiros, Tudo que eu queria te dizer.

As cartas que constam no livro são viscerais, profundas e verdadeiras.
Uma delas, eu transcrevo alguns trechos...

(sobre a filha) “Mas hoje já não tenho tanta vontade de conversar, não consigo acompanhar o ritmo da Valéria nas poucas vezes que ela aparece para uma visita. Ela fica me corrigindo toda hora, não tem a menor paciência comigo. Está uma quarentona muito bonita. Mas dura.”

(sobre a “vantagem” de morrer cedo) “Você não precisou passar pelo constrangimento de virar um idoso nesta terra de apressados. Ninguém me olha, e quando me olham não enxergam minha precariedade. Exigem de mim rapidez na fala, no caminhar, no raciocínio, como se eu fosse lenta por implicância, como se eu tivesse prazer em hesitar.”

(sobre a filha) “Não sei se ela percebe o quanto me cobra. Esta menina não se convence de que, se tanto me repito e gaguejo, não é pelo prazer de tortura-la.”... “O nome disso é decadência. Não controlo mais as minhas vacilações. Sou um corpo a serviço da humilhação.”

(sobre dificuldades) “As palavras não me chegam. Em certos momentos estou prontinha com elas na boca, mas desaparecem no instante em que vou falar. Somem sem dar-me a chance de um adeus. E, junto com elas, some todo o meu pensamento, toda a razão da conversa. Fico como uma pateta no meio do caminho, sem concluir o que havia iniciado. Disfarço, mas não gostaria de disfarçar, queira que todos prestassem bem atenção em como isso acontece e entendessem que não é de propósito que eu não completo minhas frases, não é de propósito que ando devagar, não é de propósito que meu cheiro não é agradável. Não estou querendo punir ninguém com a minha velhice.”

(falando com marido, que morreu mais jovem) “Você nunca ficou doente. Nunca mesmo, que eu me lembre. Eu também não estou com nenhuma doença séria, os médicos me fazem agrados, pedem exames e depois de avaliarem o resultado me chamam de garota, fingem que sou imortal, mas tudo me dói, cada dia surge uma pontada em um lugar diferente do corpo, e estas são as que me inquietam, as dores móveis. As fixas, que latejam sempre no mesmo lugar, são como se fossem da família. Sentiria falta delas caso me deixassem.
Que bom que você escapou. Nunca saberá como é duro despedir-se de si mesma todas as noites, antes de dormir, temendo falecer sozinha durante o sono. Mas não virei uma anciã trágica, no fundo sei que vou acordar amanhã, nem que seja para escrever longas cartas para você, que me acompanha mais com sua ausência serena do que aqueles que me escutam mais ou menos, sempre de olho no relógio.”

Dá até um arrepio na espinha, mas o fato é que todos nós, independente de qualquer circunstância, chegaremos também um dia lá!

Como não sei se poderei me comunicar tão verdadeiramente como esta senhora, então registro aqui este texto para meus filhos, nora, genro, netos e bisnetos...



vida anda tão corrida que muitas pessoas não tem mais paciência com uma pessoa idosa.

Muitos já esquceram,as noites frias que seus pais passaram oa lado do seu berço quando eram pequenos e estavam doentes.

E quando estava iniciando os primeiros passos,que os pai os seguravam para não cairem e se machucassem

As vezes muitas pessoas não se dão conta que a jovialidade,a memória não é eterna,assim como para os pais ,a memoria,a beleza acabaram,para eles

Infelizmente muitas pessoas só sabem dar valor quando perdem,ai tade de mais para o arrependimento.

Muito sábia a tua postagem Maia,sábia você se antecipando a tua velhice.


Obrigada Kelly pelas suas palavras.

Adorei!

Bjooo!


Texto Lindo e infelismente bem real nos dias de hj,já não damos valor a quem viveu e sabe muito mais do que nós ,saudades da minha vó ,já falecida... lendo isso,hj um dia frio e chuvoso ,lembrei dela assando na chapa do fogão a lenha "pinhão"pra nós quando eramos pequenos.


Pena que eles nãosão eternos , quem pode curtir um , sabe o quanto dói perder ...

Quem ainda o tem ao seu lado , não sabe o tempo que perder não dando valor pra isso.


Beijos ...


Verdade amiga, a saudades q fica dos que se vão é dolorida muitas vezes.

Valeu pelo seu comentário.

bjo!


Querida Maya... Assunto sério este seu... O amor é o elo entre nós e nossos filhos, portanto, é a linguagem básica para ensiná-los. No entanto, as crianças jogadas a esmo por ai, como aprenderão a respeitar as dores, as necessidades e as fragilidades do idoso?

Faz anos que acredito que o melhor de tudo é morrer logo.

Brilhante assunto.


Foto

Oi, Beti, faz um tempinho que também acredito na mesma coisa. Acho que o melhor é morrer logo... já me peguei pensando que meu limite será os 40 anos (ainda tenho um tempinho até lá mas...)


Por outro lado, apesar dessa opinião, faço questão de passar às minhas crianças o máximo de respeito aos mais velhos. Respeito e amor. E parece que tem dado certo... a visão do isoso, principalmente dos nossos familiares, é para ser aquela de uma pessoa sábia, mas com limitações próprias da idade - diferenças que devem ser respeitadas.

Há poucos dias perdi minha avó, de 97 anos. Foi a dor mais intensa que já senti... nunca tinha perdido um parente tão próximo (avó, pais etc). Queria que minhas crianças realmente aprendessem o valor e a sabedoria de nossos velhinhos e que aproveitassem o máximo possível dos parentes mais idosos, amando-os e entendendo-os e, principalmente, fazendo-os se sentirem amados.


Parabéns à autora do tópico pelo emocionante assunto.


Li ou assisti uma reportagem a respeito da velhice.

Entendi que nas próximas gerações, o envelhecer será totalmente saudável e não o horror que ainda existe...

A decadência do ser humano quando chega a o final é terrível.

Alguns enfrentam melhor, pois se cuidaram durante a estrada, outros nem tanto...

O assunto é complicado mesmo e ninguém gosta de olhar muito para esse lado.

Enfim...

bjo e obrigada pelo post


Adorei o blog...


obrigada amiga...